29.10.13

À Boleia (10)

Um convidado responde a questões nucleares ou essenciais sobre o cinema.
Entrevistado: Inês Moreira Santos, autora do blogue Hoje Vi(vi) um Filme e do site Espalha Factos.
Obrigado, Inês, pela colaboração.

Caminho Largo: Onde deverá residir para ti na maioria dos casos a verdadeira qualidade de um filme?

Inês Moreira Santos: Quando um filme nos consegue tocar de forma intima, profunda, verdadeiramente singular em todos os seus aspectos – visual ou espiritualmente –, essa é certamente a sua verdadeira qualidade. É difícil apontar onde ela reside, pois de certo irá variar de filme para filme. Ainda assim, é na relação com o espectador que a verdadeira qualidade se encontra, já que sem essa espécie de partilha nenhum filme poderia resistir.

CL: Fotografia, banda-sonora, interpretações ou cenografia têm o mesmo peso que argumento, realização e montagem na avaliação de um filme? Como hierarquizas, se é que faz sentido, os vários departamentos da produção?

IMS: Mais uma vez, parece-me uma questão que não pode ser avaliada da mesma forma de filme para filme. O ideal seria que todos os elementos se fundissem numa união perfeita. Haverá contudo sempre a tendência para cada um avaliar um filme consoante a sua área de preferência ou de maior interesse – eu, por exemplo, costumo dar grande importância ao argumento, mas cada vez mais me interesso pela componente visual. Contudo, é claro que há filmes muito mais visuais – Gravidade é um bom e recente exemplo disso – em que de forma nenhuma se pode deixar a componente técnica para um plano secundário. Ainda assim, as interpretações, e mesmo o argumento não deixam de ter um peso fundamental na sua avaliação. Em conclusão, todos os departamentos da produção devem ter o mesmo peso na avaliação de um filme, ou não são eles mesmos que, juntos, formam a unidade fílmica?

CL: O cinema tem de subsistir e debruçar-se sempre na realidade e/ou verdade ou pode-se refugiar totalmente no abstracto e na fantasia?

IMS: Felizmente há espaço para tudo quando falamos de cinema. Os géneros são imensos (terror, suspense, drama, romance, thriller, comédia, ficção científica, documental, musical, e tantos outros...), ficção e documentário por vezes fundem-se, a liberdade é total e as possibilidades são imensas para quem quer fazer ou ver um filme. Entre os factos ficcionados serem mais ou menos reais, ou fugirem para um campo mais fantástico, abstracto, ou mesmo surrealista, o espaço é infindável para as opções dos realizadores, e, claro está, dos espectadores.

CL: O prazer e a apreciação de se assistir a um filme numa sala de cinema são completamente diferentes e decisivos em comparação, por exemplo, à visualização através da televisão? Porquê?

IMS: São experiências distintas, ambientes diferentes, cada um com as suas mais-valias. A sala de cinema convida a uma maior introspecção, interiorização do que é projectado na grande tela. A sala escura e silenciosa faz desfrutar em pleno – se as condições forem as melhores, claro, quer em termos de projecção como de comportamento dos espectadores em sala – dessa experiência que é assistir a um filme. Contudo, é uma experiência individual. Através da televisão é diferente, mais ligada a um ambiente familiar, ou entre amigos, por exemplo. A partilha de opiniões e emoções é exteriorizada. Eu prefiro a sala de cinema, sem dúvida. Mas há momentos certos para ambos.

CL: Comenta a seguinte citação do realizador Tim Burton: "Filmes são como uma forma cara de terapia para mim."

IMS: Uma frase curiosa, que pode adaptar-se também ao público. O cinema está caro – ou a actual conjuntura o faz parecer – e quem ainda resiste e gosta de ver filmes numa sala de cinema assumirá certamente esta frase como sua – uma terapia cara, mas que vale a pena. Quanto a Burton, ainda bem que o resultado dessa terapia é, normalmente, uma óptima terapia também para os seus fãs. E quando o trabalho é terapia, que mais se pode querer? O gasto na “consulta” tem duplo retorno: monetário e de satisfação pessoal. Tomara que fosse sempre assim.

27.10.13

TCN Blog Awards 2013: Nomeados



Um ano passou, e como já vem sendo hábito de há três anos a esta parte, os TCN Blog Awards (os prémios mais cobiçados por blogues e sites nacionais de cinema e televisão) estão aí para a sua 4ª Edição, iniciando o seu processo de nomeações e consequente votação, agora referente ao ano de 2013, sempre nunca esquecendo o seu grande e único objectivo - premiar e, sobretudo, divulgar o que de melhor se fez e se faz na comunidade.

Com a divulgação de todos os nomeados, constata-se então que o Caminho Largo agradavelmente encontra-se, outra vez, nomeado, desta feita em mais categorias que o ano transacto, nomeadamente em Melhor Iniciativa (com a rubrica À Boleia), Melhor Crítica de Cinema (pela segunda vez em anos consecutivos - com Tokyo Story (Tôkyô monogatari), de Yasujirô Ozu), Melhor Blogue Individual (Caminho Largo) e Melhor Blogger do Ano (Jorge Teixeira). Estas nomeações só vêm reflectir orgulhosamente uma evolução ou, pelo menos, uma continuidade de um aparente e reconhecido bom trabalho, este que visa, e visará incessantemente, o cinema, as suas linguagens e as suas influências, sempre com o intuito de aprender e desenvolver o conhecimento e o pensamento sobre esta arte que nos une e nos fascina a todos a conviver.

Destaque ainda para o meu envolvimento nas dezenas de nomeações que, ao todo, o CCOP indirecta e meritoriamente obteve com os seus membros (facto de extremo orgulho), e para a minha colaboração em mais quatro iniciativas que foram nomeadas conjuntamente, são elas: Cinema Bloggers Awards 2014O meu CicloPosters Caseiros: O LivroUm Filme, Uma Mulher. Todas, e para além destas, sem excepção, mais que merecidas, no que se revela uma categoria muito forte e sólida - um autêntico exemplo, entre tantos outros, de que a blogosfera portuguesa está viva e, apesar de tudo, de boa saúde.

Por tudo isto, resta-nos agradecer muito a todos aqueles que nos lêem, comentam e seguem, a todos aqueles que contribuíram ou que colaboraram, em especial, na iniciativa nomeada, e a todos aqueles que nos distinguiram e que nos nomearam e que, portanto, estimam e se interessam por este espaço, que tanto prazer e tanta dedicação acumula, e continuará certamente a acumular diariamente.

Por último, como é hábito, apelamos efusivamente, primeiro, à leitura de todo o material selecionado e nomeado, segundo, ao voto, que se pode exercer na barra lateral direita do blogue organizador e dinamizador dos prémios - Cinema Notebook (em parceria com a Take Cinema Magazine). Caso a votação incida ou se relacione com o Caminho Largo agradecemos desde já, sendo que para isso basta seleccionar, especificamente, as opções certas nas categorias correspondentes - À Boleia para IniciativaTokyo Story para Crítica Cinema, Caminho Largo para Blogue Individual e Jorge Teixeira para Blogger do Ano. Acima de tudo, independentemente de preferências, não se esqueçam, votem - aqui - por uma blogosfera mais forte!

Jorge Teixeira e Pedro Teixeira

19.10.13

CCOP: Top de Setembro de 2013



A distribuição massiva de filmes nas últimas semanas (por vezes com onze estreias na mesma semana), tem reduzido a percentagem de filmes elegíveis aos tops mensais. Caso flagrante o de Setembro, onde com trinta e quatro filmes estreados, apenas onze figuram no top mensal. Se nem os críticos (naturalmente mais propensos a assistirem aos filmes que estreiam) conseguem cobrir por completo o mapa de estreias mensais, imaginemos então o que acontece nas salas de cinema portuguesas, por sinal cada vez mais vazias. Em Setembro, a estreia de Blue Jasmine lidera o pódio e apesar da honrosa nota média (7,92), o filme apenas consegue ocupar a décima posição do top anual, ex-aequo com Searching for Sugar Man (À Procura de Sugar Man). Olhando para o top especial dedicado ao cinema de Woody Allen, ficamos a saber que Blue Jasmine figura no décimo quarto lugar dos melhores filmes do cineasta, para os membros do CCOP (Annie Hall é o preferido do grupo, com a nota média de 9,64 em 10). Steven Soderbergh e o seu Behind the Candelabra (Por Detrás do Candelabro) ocupa a segunda posição do pódio de Setembro, com a nota média de 7,64. Vale a pena referir que foi recusado financiamento a esta produção em Hollywood, por se considerar "demasiado gay" para o cinema, acabando por ser produzido e por estrear em televisão, no canal HBO. O CCOP confirma assim o favoritismo deste filme junto da crítica e não só, depois até de Behind the Candelabra (Por Detrás do Candelabro) ter sido candidato à Palma d'Ouro 2013. A terceira posição do pódio é ocupada por Insensibles (Insensíveis), do realizador espanhol Juan Carlos Medina e co-produzido pelo português Luís Galvão Telles, através da Fado Filmes. O filme foi exibido em Portugal nos festivais Fantasporto e MOTELx. Nota ainda para a estreia em cinema de dois clássicos do cinema japonês e duas obras-primas do cineasta japonês Yasujirô OzuTokyo Story (Tôkyô monogatari) (Viagem a Tóquio)An Autumn Afternoon (Sanma no aji) (O Gosto do Sakê) foram trazidos aos cinemas nacionais pela Leopardo Filmes e os membros do CCOP atribuíram-lhes a excelentes classificações médias de 9,00 e 8,25; respectivamente.

Como é habitual, para consultar o top anual e todos os anteriores tops ou ainda outras informações, ir ao site oficial do Círculo de Críticos Online Portugueses aqui. Eis então o top completo dos filmes, com suficiente amostragem, estreados em Portugal em Setembro de 2013:

1. Blue Jasmine (2013)
Woody Allen | 7,92
2. Behind the Candelabra (2013)
Por Detrás do Candelabro, Steven Soderbergh | 7,64
3. Insensibles (2012)
Insensíveis, Juan Carlos Medina | 7,60
4. The Place Beyond the Pines (2012)
Como Um Trovão, Derek Cianfrance | 7,50
5. Like Someone in Love (2012)
Abbas Kiarostami | 7,43
6. The Conjuring (2013)
The Conjuring - A EvocaçãoJames Wan | 7,18
7. Kon-Tiki (2012)
Kon-Tiki - A Viagem Impossível, Joachim Rønning e Espen Sandberg | 6,75
8. The Butler (2013)
O MordomoLee Daniels | 6,44
9. Dark Horse (2011)
Dark Horse - Diários de um FalhadoTodd Solondz | 6,00
10. The Heat (2013)
Armadas e Perigosas, Paul Feig | 5,86
11. Diana (2013)
Oliver Hirschbiegel | 3,60

17.10.13

Filmes que Marcaram



A convite do blogue Sala3 participei na iniciativa Filmes que Marcaram (o nome diz tudo), que o mesmo lançou e que contará com inúmeros bloggers da nossa praça. Foi então com imenso prazer que abordei, seleccionei e estruturei os filmes que mais me marcaram (impossível escolher apenas um ou dois), ou aqueles que por este ou por aquele motivo me construíram e me conduziram à paixão e à cinefilia que hoje tenho ou que poderei plausivelmente vir a ter.

As minhas escolhas, assim como toda a iniciativa (que ainda agora começou), estão aqui. Obrigado pelo convite, e que a blogosfera continue a (sobre)viver e a interagir também desta forma que tanto estimula o pensamento e a partilha de conhecimento.

10.10.13

Manual de Regras (9)

As paredes têm ouvidos.

The Others (2001)
Os Outros, Alejandro Amenábar

7.10.13

Citações (12)

A Few Good Men (1992), Rob Reiner


Judge RandolphCONSIDER YOURSELF IN CONTEMPT!
Col. JessepCOLONEL JESSEP, DID YOU ORDER THE CODE RED?
Judge RandolphYou DON'T have to answer that question!
Col. JessepI'll answer the question!
Col. JessepYou want answers?
KaffeeI think I'm entitled to.
Col. JessepYOU WANT ANSWERS?
KaffeeI WANT THE TRUTH!
Col. JessepYOU CAN'T HANDLE THE TRUTH!
Col. JessepSon we live in a world that has walls, and those walls have to be guarded by men with guns. Who's gonna do it? You? You, Lt. Weinburg? I have a greater responsibility than you could possibly fathom. You weep for Santiago, and you curse the Marines. You have that luxury. You have the luxury of not knowing what I know. That Santiago's death, while tragic, probably saved lives. And my existence, while grotesque and incomprehensible to you, saves lives. You don't want the truth because deep down in places you don't talk about at parties, you want me on that wall, you need me on that wall. We use words like honor, code, loyalty. We use these words as the backbone of a life spent defending something. You use them as a punchline. I have neither the time nor the inclination to explain myself to a man who rises and sleeps under the blanket of the very freedom that I provide, and then questions the manner in which I provide it. I would rather you just said thank you, and went on your way, Otherwise I suggest you pick up a weapon, and stand a post. Either way, I don't give a damn what you think you are entitled to.
KaffeeDid you order the Code Red?
Col. JessepI did the job I...
KaffeeDID YOU ORDER THE CODE RED?
Col. JessepYOU'RE GODDAMN RIGHT I DID!

4.10.13

5 Grandes Filmes de Ficção Científica (3)


Alphaville, une étrange aventure de Lemmy Caution (1965)
Alphaville, Jean-Luc Godard

Fahrenheit 451 (1966)
Grau de Destruição, François Truffaut

A Clockwork Orange (1971)
Laranja Mecânica, Stanley Kubrick

Stalker (1979)
Andrei Tarkovsky

Brazil (1985)
Brazil: O Outro Lado do Sonho, Terry Gilliam

por Jorge Teixeira e Pedro Teixeira

Percursos (2)

Entre James Stewart e Anthony Mann


Há um momento em que acordamos, em que nos apercebemos dessa mudança (essa alternativa), silenciosa, poderosa, que nos diz e nos confirma que com insistência, paciência e teimosia a fasquia é ultrapassada e uma nova meta se projecta à nossa frente, surgindo depois todo um novo mundo a ser explorado, aí sim com prazer redobrado o suficiente para galgarmos mais uns degraus desta arte classificada de sétima. Falo, pois, do gosto pelo cinema clássico, pelo cinema antigo, pelo cinema adverso à velocidade e à fragilidade de hoje em dia. De Hollywood à Europa, como é óbvio, sem restringimentos ou limitações, e ainda que o primeiro se estenda inevitavelmente mais. Por isso, e apenas pelo acaso, foquemo-nos agora na época de ouro americana, onde o mudo já lá ia, mas subsistia nos alicerces e na construção, e onde havia uma série de mecânicas ou relações evidentes, de actores com realizadores, de realizadores com compositores, de compositores com argumentistas, etc. A nostalgia e o objectivo aqui serão naquele que é, provavelmente, o mais romântico e inspirador género americano - o Western, em particular, na parceria entre James StewartAnthony Mann, porventura a mais célebre e a mais singular de todas as que o primeiro fez parte (que me desculpem Capra, Hitchcock e Ford).

Lembro-me, como se fosse hoje, a primeira vez que vi o astro de James Stewart no ecrã, dirigido então por Hitchcock nesse incontornável exercício cinematográfico que é Rear Window, onde o mesmo domina todo o espaço e todo o imaginário conceptual do próprio filme. Mais que uma memória que prevalece, o actor torna-se de imediato numa aposta fiável, segura e consistente. Posteriormente, e passando por mais alguns filmes do mestre do suspense (entre eles Rope e a sua obra-prima Vertigo) ou pela famosa e duradoura colaboração que teve com Frank Capra (de que It's a Wonderful Life é um dos faróis máximos), James Stewart confirma o expectável e demonstra porque foi considerado, à época, um dos melhores da sua geração, facto que lhe é meritório e ao mesmo tempo lhe é caro e inevitável tendo em conta os projectos comerciais que sempre abraçou, e logo a projecção que isso acarretou. Nada que o diminua, até porque curiosamente, ou nem por isso, uma das melhores interpretações que alcançou não foi nesta fase inicial ou mais adulta, mas sim já no começo da velhice, na sua prestação em The Man Who Shot Liberty Valance de John Ford, onde a idade e o registo da personagem contribuíram provavelmente para uma suavidade e profundidade que lhe eram exigidas, e que o mesmo fez questão de superar.

No seguimento (não cronológico, nunca é), era certo e sabido que o par Anthony Mann-James Stewart faria as delícias das próximas visualizações, colmatados que estavam agora os seus filmes mais famosos. Começou-se por Winchester '73, o primeiro e um dos mais carismáticos e conhecidos da dupla, e se aqui Stewart continua com o seu absorvente registo profundo e eficaz (de resto como nos tinha habituado), Anthony Mann (cineasta esquecido e algo desprezado no seu tempo) surpreendo-nos, delicia-nos com uma história em tudo simbólica de dois cowboys, uma espingarda e a respectiva caça ao homem (ou à arma), que nos atrai desde logo a atenção e se revela por isso como uma referência a não esquecer. Com efeito, o realizador filma com uma cadência e segurança invejáveis, com campos e contra-campos graciosos, ansiosos e duvidosos (como é sempre de esperar), e uma composição sonora e musical rítmicas e mais que apropriadas.

Trata-se, na realidade, de um filme de outro tempo, do seu tempo, do tempo dos Westerns ou do refinado cinema americano, aquele que se importava, acima de qualquer outro factor, com os personagens, com a sua edificação e a relação para com o espectador. Para muitos, um dos melhores Westerns de sempre, entre numerosos que o cineasta realizou, e para além da sua versatilidade que o dignificou com filmes sem o seu parceiro habitual e especial, tais como The Tin Star, Man of the West ou The Fall of the Roman Empire. Não será, portanto, de admirar que o potencial de James Stewart atinja aqui proporções elevadas, não tanto na intensidade, mas sim na intimidade e na regularidade que nos transmite, no caso, mas a partir deste primeiro tomo, de projecto em projecto, de filme em filme, ou simplesmente, de Mann a Mann, no que perfez mais sete colaborações (entre os quais quatro Westerns). E é assim que chegamos aos famosos cinco filmes da parceria, de Winchester '73 viajamos até Bend of the River, outro grande filme de Mann, e deste para The Naked Spur, talvez o mais belo e o mais consensual filme para a crítica e para o público, para finalizarmos com The Far CountryThe Man from Laramie, duas excelentes incursões por este mundo de vingança, de orgulho e, paradoxalmente, de amor e camaradagem.

Anthony Mann em todos estes filmes sempre deu a James Stewart uma complexidade psicológica e uma diversidade ontológica interessantes e, em parte, diferentes de qualquer outro realizador. É sabido que Mann tinha um carácter vincado e por vezes teimoso, particularidade que até originou o fim da parceria entre ambos, mas essas características provavelmente só lhe aumentaram a competência, o rigor e a entrega para com o trabalho dos outros, nomeadamente com os actores e especificamente com Stewart. Em cinco anos, de 1950 a 1955, os dois contribuíram com cinco filmes que renovaram e personalizaram para sempre o género, ao jeito de um sustentado fim do classicismo, e que anteciparam, num Western (mais) moderno, as obras-primas de Ford e de Hawks (The Searchers e Rio Bravo respectivamente), sendo que, à semelhança de uma boa novela ou das actuais sequelas, todos os filmes se articulam e como que se relacionam entre si, na simbiose e identificação que existe entre o trio espectador, actor e realizador. Há, de facto, uma gradual progressão intelectual e uma riqueza construtiva implícita na alternância entre o eu-observador e o tu-orador (que narra e que se expõe) e na dinâmica autor-personagem e, por isso, sobretudo uma ligação resistente entre os dois homens que ecoa e reforçadamente pressentimos no (grande) ecrã. Totalmente inseparáveis, e por conseguinte, uma autêntica e premeditada melancolia quando se termina o último "episódio" desta saga, por assim dizer, com a certeza, porém, de queremos (e devermos) voltar sistemática e regularmente aos mesmos, e, desse modo, descobrirmos sempre algo de novo (o que é normal, mas não menos genial).

A mudança, inicialmente referida, fortalece-se então neste ponto ou neste estágio de conhecimento, onde a aparente repetição autoral e a vinculação a um registo interpretativo são máximas e altamente emocionais e recompensatórias. Uma fase que não se esquecerá e que definirá para sempre uma etapa de uma determinada cinefilia que adquire com esta parceria uma solidez e uma tranquilidade imprescindíveis. Na prática, a referência, a imortalização ou a lenda surge, até aos nossos dias, com estes cinco sequenciais grandes filmes do Western ou do Faroeste, considerado por muitos o cinema americano por excelência.