A Invenção de Hugo,
Martin Scorsese
Antes de mais, congratular Scorsese na precisa e nostálgica homenagem que fabricou aos primórdios do cinema (ao que parece tão esquecido e enterrado) sobretudo, porque carrega em si, mesmo que involuntariamente, toda uma aprendizagem, uma história e acima de tudo uma cultura inestimáveis, rebuscadas desde o período mudo até à recente inovação a três dimensões de que, aliás, se serve adequadamente.
Depois, expressar a minha desilusão pelo produto final, pelo que aquilo que se antevinha como emocional, arrebatador e essencial, se traduziu num simples e descomplexo exercício narrativo (porque de filmagem Scorsesiana, caracterizada, nem vê-la) típico, sensacionalista, fantástico em demasia e escasso no que, essencialmente, diz. Em suma, uma história ingénua, de deslumbramento fácil e por isso pouco verdadeira e pouco profunda no que quer, tão altruisticamente, transmitir - ainda que inevitavelmente o consiga em parte, daí a significante estima que se lhe tem.
Hugo, o personagem e o filme, transportam inicialmente todo um imaginário fabricado pelas expectativas, pelas sugestões e indicações que nos vão sendo projectadas, e por todo um peso cultural que a sua história e mensagem acarretam. Tudo, repito, segundo um padrão ainda assim recorrente e mecanizado. A própria construção dos personagens é em si curta, pouco densa, usando (e abusando) de alguns membros como meros guias na viagem e interpretação temporais (a Isabelle de Chloë Moretz, por exemplo). Ao invés de explorar os instrumentos que detém para alcançar um melhor desempenho e destreza culturais e emocionais, recorre à técnica e tácticas usuais numa estrutura formal claramente repetitiva e dependente de mecanismos-base da indústria de que faz parte. Apesar de utilizar esses recursos, há que o dizer, equilibrada e proporcionalmente, nunca se desfazendo ou se reduzindo, nesse sentido, em demasia.
Por outro lado, no encalço da câmara (e do 3D) acompanhamos o início com alguma dinâmica, no excelente plano-sequência e na exploração que as potencialidades argumentativas evidenciam ou a inovação tecnológica assim o permita. No entanto, essa vontade às tantas também se reduz à tal cadência comum do seio no qual o filme se insere e se vende. Uma pena, novamente, perante o enorme alcance que poderia ter tido e a enorme capacidade que detinha, seja no tema em si, seja nas linguagens da sugestão e manipulação de um cinema mudo, que poderia e deveria ter sido muito mais explorado. No fim, contudo, o resultado não se afigura assim tão mau, está inclusive acima da média, sendo que se trata de um filme interessante, capaz, apesar de tudo, de reflectir e transmitir qualquer coisa, no caso - uma sugestão para toda a família e uma homenagem a George Méliès, um dos primeiros e maiores impulsionadores da sétima arte enquanto fábula, enquanto ficção.
★★★★★★★★★★
Jorge Teixeira
classificação: 6/10